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SIMAIA SAMPAIO
Psicóloga, Neuropsicóloga
Psicopedagoga
Educação Sexual: para além dos tabus
Por: Simaia Sampaio
Introdução
Ao tratar do tema educação sexual, busca-se considerar a sexualidade como algo inerente à vida e à saúde, que se expressa desde cedo no ser humano. Engloba o papel do homem e da mulher, o respeito por si e pelo outro, as discriminações e os estereótipos atribuídos e vivenciados em seus relacionamentos, o avanço da AIDS e da gravidez indesejada na adolescência, entre outros que são problemas atuais e preocupantes.
Todos esses fatores denotam uma necessidade cada vez maior da inclusão da temática sexual no currículo escolar. A família, que deveria ser responsável por esse encaminhamento, não se sente preparada o suficiente para abordar o assunto não propiciando uma abertura para a conversa em casa. Sendo assim, os pais transferem para a escola mais essa responsabilidade.
A sexualidade sempre foi um tema de difícil discussão, sobretudo para crianças e adolescentes; a curiosidade, a percepção das diferenças no próprio corpo e no corpo do outro, a descoberta das carícias e a fonte incontestável de prazer que o sexo representa, fizeram do assunto um tabu e algo que “não é conversa para crianças” contribuindo ainda mais para aguçar a imaginação de cabecinhas ávidas por informações. Como essas informações não são conseguidas em casa, entram em ação os “colegas sabe-tudo” que, na maioria das vezes, sabem muito pouco e acabam deturpando fatos e informações, criando dúvidas ainda maiores.
Como agravante, estamos vivendo a “era do show do sexo” onde a erotização invade as casa através de jornais, revistas, rádio, internet e, principalmente, a televisão. Influenciadas pelos ídolos, as crianças estão cada vez mais erotizadas e os jovens iniciam a vida sexual cada vez mais cedo, muitas vezes sem a devida preocupação, resultando, em muitas ocasiões, em gravidez indesejada de garotas recém-saídas da infância.
Por todos esses motivos se torna tão necessária a presença da escola como orientadora através de educadores preparados para esclarecer as dúvidas dos alunos, lidando, inclusive, com questões como preconceito no que diz respeito à preferência sexual.
É importante que o professor demonstre que as manifestações da sexualidade infantil são prazerosas e fazem parte do desenvolvimento saudável de todo ser humano, dessa forma o professor estará contribuindo para que o aluno reconheça como legítimas suas necessidades e desejos de obtenção de prazer, ao mesmo tempo em que processa as normas de comportamento próprias do convívio social.
VISÃO DO SEXO NA SOCIEDADE
Na antigüidade e na Idade Média, as crianças européias falavam abertamente de sexo. A partir do século XVI os europeus passaram a redefinir a criança como um ser inocente o que se perdurou até hoje.
O sexo foi ligado a algo "sujo" e "mau". Apesar de reconhecermos a sexualidade como prazerosa, o sexo também é usado em nossa sociedade como fonte de lucro e opressão como em propagandas de televisão, prostituição, pornografia etc. Com isto procuramos afastar nossos filhos desse meio esquecendo-nos mesmo dos prazeres pessoais que o sexo nos proporciona.
Antigamente os valores mudavam muito lentamente. A partir do surgimento dos meios de comunicação, o processo de mudança de concepções e quebra de tabus ficou bastante acelerado. As novelas, os filmes e propagandas colocaram o sexo como chamada de atenção para seus produtos. Os pais, em meio a tantas mudanças, ficaram meio perdidos visto que, no seu tempo, como dizem, não havia tanta liberdade cuja educação era mais rígida e tradicional.
Atualmente, urge uma necessidade maior de se conversar com os filhos e alunos, no caso da escola, sobre sexo, um assunto tão relevante e que bem sabemos, faz parte do cotidiano de todos, seja de forma direta no caso dos casais, seja de forma indireta no caso das crianças que são diariamente expostos a propagandas e novelas que se usam desta ferramenta para aumentar sua audiência. O mais agravante é que as crianças menores não compreendem o significado destas mensagens na televisão, construindo assim conceitos distorcidos e fantasiosos sobre a sexualidade.
O sexo também não é mais visto como pecado por muitos. A virgindade deixou de ser tabu para se tornar uma opção. Existem muitas fontes de informação e um ambiente mais favorável onde o tema já é discutido em muitas famílias e escolas, ainda que seja com restrições e preocupações. Os adolescentes conquistam cada vez mais a liberdade de escolher o momento da própria iniciação sexual.
Mas, paralelo a este sexo despojado de preconceitos surge a era do sexo perigoso, diante do qual faz-se necessário alertar para perigos como doenças, gravidez precoce e indesejada e muitos outros fatores conseqüentes da falta de informação.
No entanto, informar apenas não basta. Sentimentos como afeto, fantasias, medos, não são compartilhados entre pais e filhos porque ainda existe um clima de vergonha no ar.
FREUD E A SEXUALIDADE INFANTIL
Inicialmente, Freud acreditava que a sexualidade humana só se desenvolvia na puberdade, período em que o organismo poderia procriar. Entretanto ele começou a rever estas questões com estudos sobre a sexualidade infantil.
Freud fala das pulsões sexuais que são vividas livremente pelas crianças e experimentadas à parte não havendo ainda um objeto sexual. A pulsão sexual tal como vemos em ação em um adulto é composta de pulsões parciais, cuja ação se observa nas preliminares do ato sexual. Cada pulsão se liga ao prazer extraído do órgão a que estiver vinculado. Exemplo: olho, no caso da contemplação; genital próprio, no caso da masturbação; boca, no caso da sucção do polegar; ânus, no caso da defecação. Será uma pulsão dirigida ao próprio corpo que não buscará um outro corpo, como acontecerá na puberdade. (KUPFER, P. 41, 1997).
Como há ausência do objeto sexual, a pulsão sexual não possui outros fins senão os propriamente sexuais e é passível de sublimação. É aí que interessa ao educador cuja educação, segundo Freud, terá seu papel primordial. O indivíduo, havendo a "dessexualização" do objeto poderá voltar-se para atividades sexualmente elevadas, tais como, produção científica, artística e tudo aquilo que proporcionar bem estar. Essas atividades serão impulsionadas pela libido, mas a antiga ânsia sexual ainda permanece só que de modo mais brando, terno, prazeroso.
Para entendermos a sublimação tomaremos como exemplo a pulsão parcial anal: quando esta fase está sendo construída a criança volta-se para tudo que diz respeito a esta região do corpo. Descobre que dela se desprendem as fezes. É natural que desejem manipulá-las. Mais tarde, parte dessa pulsão será reprimida, parte irá compor a sexualidade genital e parte será sublimada, transformando-se, por exemplo, na atividade de esculpir argila, havendo dessexualização do objeto no caso, a argila.
Crianças de tenra idade sentem prazer ao urinar ou defecar querendo brincar ou pegar. Podem querer examinar seus genitais ou dos amiguinhos. Os pais ao ver qualquer destas cenas, não devem surpreender-se ou aborrecer-se. Os pais ou pessoas que trabalham com crianças devem ter em mente que a masturbação é normal e faz parte do processo de conhecimento de seu corpo. O problema é que isto nos traz um certo desconforto porque é muito provável que nossos pais tenham nos dito que isto era feio ou para não fazer isto de novo.
Realmente é difícil para os pais lidarem com situações como estas, mas é necessário aprender para não serem severos. Não devemos olhar os atos infantis comparando-os com a dos adultos. A criança não faz nenhuma relação com o "sexo em si", ela apenas sente prazer. Mais tarde poderá sentir-se culpada por ter sido desaprovada pelos pais ou pessoas que trabalham com elas e esta culpa poderá ser levada para sua própria experiência sexual.
Freud coloca os pais como pessoas incompetentes para a tarefa da educação sexual preferindo que estes não se ocupem desta tarefa. Para ele, os pais esqueceram-se da sexualidade infantil e, se esqueceram, é porque houve repressão. (KUPFER, p. 47, 1997). Se houve repressão inevitavelmente algum recalque ainda permanece. Então como agir mesmo com todas as nossas frustrações, recalques e conflitos ainda que inconscientes?
A PRIMEIRA EDUCAÇÃO
É no lar que o ser humano deveria ter sua primeira educação sexual. De acordo com a sexóloga Marta Suplicy,
"Uma criança falante e curiosa pode começar a mostrar interesse pelo sexo aos 2-3 anos, mesmo sem o uso da palavra. A maioria o fará com 4-5 anos de idade" (1983, p. 36).Nesta fase o que a criança quer saber é muito pouco, não é preciso explicar detalhes, mas também não minta, não brigue, não desconverse, explique o básico na linguagem que ela puder entender.Muitos pais acreditam que as crianças não devem fazer perguntas sobre sexo por acreditar que não possuem idade suficiente para entender, considerando, portanto, um absurdo qualquer menção a este assunto. Muitos adultos se escondem, sentem vergonha e a causa pode estar numa infância mal orientada.
No texto de Freud “Esclarecimento sexual das crianças” em resposta a uma carta de Dr. M. Fürst, ele afirma que as crianças devem receber educação sexual assim que demonstrem algum interesse pela questão (KUPFER, p. 46, 1997).
A criança que tem idade para perguntar também tem idade para ouvir. Os pais nunca devem dar respostas imaginárias e irreais como, por exemplo: se a criança perguntar como nasceu o pai responder que foi a cegonha que trouxe, ao invés de falar a verdade na linguagem adequada para cada idade.
Quando a criança descobre que os pais estão mentindo ela se sente enganada como afirma Suplicy, “No momento que seu filho descobrir que você o engana você não será mais um pai ou mãe perguntável. Você perde a credibilidade, mas seu filho continua curioso e perguntará aos colegas” (1983, p. 36).
Não adianta falar sobre espermatozóides e óvulos com uma criança de 2 ou 3 anos, nesta idade muita explicação pode confundir e o tempo de concentração é muito pequeno, portanto os pais devem ser breves, seguros e sobretudo falar com naturalidade.
As primeiras perguntas feitas pelas crianças geralmente são: porque o pipi do papai maior que o meu? Porque ele tem esses pelinhos e eu não? Onde está o pipi da mamãe? Por onde saem os bebês? Isto acontece porque nas primeiras perguntas infantis a criança faz uma constatação do que observa, segundo Suplicy. A mesma autora ainda observa que conforme a criança vai crescendo as perguntas vão se sofisticando, e ao redor dos quatro-cinco anos ela já quer saber como o bebê sai da barriga da mãe. E, provavelmente a pergunta seguinte será como entrou” (1983, p. 36).
Estas perguntas devem ser respondidas da forma mais natural possível. Se os pais a repreendem, a criança nunca mais lhes perguntará e continuará tão curiosa quanto antes, afinal está numa fase de descobertas. Sem a ajuda deles ela poderá interpretar o sexo de forma errada, acreditando, por exemplo, que seu pênis tem algum problema por ser menor que o do pai, que o pênis da mamãe ou da irmã foi cortado.
Muitos pais não sabem como responder a este interrogatório. Uma das perguntas mais difíceis dos pais responderem é “como o bebê entrou na barriga da mamãe?” O livro Mamãe botou um ovo!, de Babette Colle, apresenta uma alternativa de resposta: “A mamãe tem ovos dentro da barriga. O papai tem sementes nos saquinhos que ficam fora do seu corpo. O papai tem um tubo. As sementes que estão nos saquinhos saem por ali. O papai encaixa na mamãe e o tubo entra na barriga dela por um pequeno buraco. Então as sementes nadam lá dentro com a ajuda de seus rabinhos até o ovo. Quando os dois se juntam formam o bebê”.
Explicações como esta já podem ser dadas a crianças de 4 a 6 anos. Antes disso é difícil compreender e depois disso já é necessário uma linguagem mais próxima do real para evitar distorções, mesmo porque eles já ouvem comentários dos colegas e já estão mais ligados em algumas cenas de novelas ou filmes.
Surgindo o interesse, não antes disso para não precipitar sua maturidade, os pais poderão utilizar um livro de sexo para crianças como recurso, utilizando o nome correto dos órgãos genitais como pênis, vagina e não pinto, cocota, piriquita e outras expressões.
Da mesma forma e sempre, as respostas devem ser verdadeiras e claras. Alguns pais acreditam que a criança ficará assustada com palavras como pênis, vagina, espermatozóide. A partir de 4 anos já é possível falar sobre o parto natural ou cesárea, sobre a relação do papai e da mamãe, lembrando-se sempre: na linguagem adequada e nada de assombros.
Citaremos abaixo alguns exemplos de diálogo com crianças, extraídas do livro “Falando com seu filho sobre sexo: perguntas e respostas para crianças do nascimento até a puberdade”.
Até os três anos:_ O que é isto?_ É um pênis._ Para que serve?_ É com ele que os meninos fazem xixi._ Olhe, ele fica duro._ Certo! Todos os pênis fazem isto de vez em quando._ Papai tem um pênis também?_ Tem; todos os homens e meninos têm um._ Ele fica duro também?_ Algumas vezes. Ele se sente bem assim._ O que é isto?_ Chama-se vulva._ Por que é toda cabeluda?_ Todas as mulheres crescidas têm cabelos aí._ Porque eu não tenho?_ Para meninas: É porque você ainda não cresceu. Quando Você crescer, terá cabelos aí, igual à mamãe._ Para meninos: Você terá cabelos em volta do seu pênis quando crescer._ O que é esse saquinho? Tem bolinhas._ É um escroto, e os dois caroços parecidos com bolinhas chama-se testículos.Cinco e seis anos:_ O que quer dizer ”foder”?_ Significa ter relação sexual, quando o homem introduz o pênis na vagina de uma mulher. “Foda” é uma palavra da gíria que não deve ser usada em público. Não é educado e muitas pessoas consideram esta uma palavra muito feia mesmo quando não é dita em público. Portanto quando você estiver com outras pessoas nunca diga “foder”, não importando como os outros façam._ O que é boceta?_ Boceta é o nome da vagina na gíria. Há outras palavras para vagina que são tão grosseiras quanto esta. Sem dúvida eu não gostaria de escutar alguém chamar uma vagina por este nome, embora algumas pessoas usem esta palavra quando estão a sós, sem que estejam xingando ou ofendendo alguém. Nunca use uma gíria como esta em público._ O que quer dizer “puta”?_ Puta é o nome usado para uma prostituta na gíria. É uma pessoa que tem relações sexuais por dinheiro e não por amor.É muito comum a professora ouvir risadinhas quando, numa aula de ciências, são mostradas figuras dos órgãos genitais no estudo do corpo humano e o aparelho urinário. Observamos espantos, murmúrios, indignações. Isto acontece, muitas vezes, por falta de orientação dos pais em casa. Muitas meninas só ficam sabendo que vão menstruar quando conversam com outras colegas que já tiveram esta experiência. Muitas sentem vergonha dos seios que começam a crescer usando como alternativa uma camiseta por baixo da farda ao invés de pedir um sutiã à mãe, e esta, por sua vez, não percebe o constrangimento da filha. Tudo isso mexe com a cabeça do adolescente que além de sofrer todas estas transformações no corpo ainda não contam com o apoio e orientação adequada dos pais.
Se uma criança não tem desde cedo um esclarecimento sobre assuntos ligados ao sexo, não compartilha seus medos e ansiedade com seus pais, se os pais não lhe dão apoio nas suas descobertas, certamente ela será um adolescente carregado de dúvidas buscando em revistas e conversas com amigos o entendimento deste processo e provavelmente um adulto com complexos, culpas e preconceitos, como observa Fagundes: “A sexualidade infantil estabelece as bases para a sexualidade na adolescência e para a sexualidade na vida adulta”.
CONVERSANDO COM ADOLESCENTES
Para chegarmos à adolescência recorreremos à psicanálise para ratificar a afirmação de Fagundes feita no parágrafo anterior, monstrando as fases do desenvolvimento sexual infantil:
Fase oral ou fase da libido oral, ou hedonismo bucal – a criança dos 0 aos 2 anos, através da estimulação da zona oral (sucção, mastigação, satisfação da fome) sente sensações agradáveis de prazer. Nesta fase tudo que vê quer levar à boca.
Fase anal ou fase da libido ou hedonismo anal – nesta fase a criança entre 2 e 3 anos sente prazer em poder controlar parte de seu corpo retendo ou liberando as fezes, começa então a controlar suas vontades e tomar decisões. Sente prazer em brincar com massas de modelar, argilas, barro.
Fase fálica ou fase genital, ou fase da libido ou hedonismo genital– quando começa a interessar-se pelo corpo e manipular seus órgãos genitais. É nesta fase que se inicia o complexo edipiano. No complexo de Édipo o menino sente um amor intenso pela mãe, identificando-se com o pai, sente desejo em ocupar seu lugar sentindo então raiva, medo e culpa. Imagina então que o pai pode cortar seu pênis (complexo de castração). A menina também vive este complexo, mas neste caso sente inveja do pênis. Para a psicanálise o complexo de Édipo é um período fundamental na estruturação da personalidade e a base da identidade do indivíduo.
Inicia então um período de latência que vai até a puberdade e caracteriza-se por uma diminuição das atividades sexuais. A criança entre 6 e 10 anos tem sua sexualidade parte reprimida e parte sublimada, deslocando a energia para atividades e aprendizagens intelectuais e sociais.
Fase genital – é a chegada da puberdade, da adolescência no qual o complexo de Édipo reaparece, porém mais perigoso já que o desejo incestuoso pelo pai/mãe agora pode ser realizado com o surgimento da sexualidade genital. Mas paralelo a isto o superego é organizado e surge como uma barreira ao incesto reprimindo os pensamentos perigosos e censurando o ego que é responsável pelo controle dos instintos. Ocorre então o deslocamento das fantasias de dentro para fora da família, o que gera muita ansiedade e culpa. Juntamente a este deslocamento surge o processo de desligamento da autoridade dos pais.
Segundo Becker, esta necessidade de separação levaria à rejeição e hostilidade aos pais, apresentando comportamentos e atitudes diferentes das dos genitores para diferenciar-se da família. Passa então a buscar uma pessoa acessível para satisfazer seus impulsos, que será ele mesmo. Afirma ainda que a masturbação é importante não só para descarga dos impulsos, mas para que ele tenha contato com o próprio corpo preparando-o para as relações sexuais.
Muitos jovens passam por conflitos e crises e se apresentam com comportamentos rebeldes e hostis. É difícil para os pais entenderem esta fase de transição, pois a rebeldia os machuca. Até então tinha seu filho sob sua proteção, em baixo de seus olhos, obedecendo-os e lhes dando satisfações sobre o que ocorria na escola, com os colegas etc. Agora têm em sua casa um estranho que quase não pára em casa, e quando não está na rua está pendurado ao telefone ou trancado no quarto ouvindo o som nas alturas. Já não quer compartilhar momentos em família porque esta lhe parece careta.
Todo este processo está ligado à sua sexualidade, ao desejo de mostrar-se independente e, não sabendo lidar com estas mudanças, muitos acabam tendo um baixo rendimento escolar.
Podemos encontrar adolescentes e adultos perturbados, frustrados, medrosos. O medo está no momento do desempenho sexual e suas dúvidas muitas vezes ligadas ao uso correto dos métodos anticoncepcionais e doenças sexualmente transmissíveis.
Para muitos adolescentes, hoje, quem é virgem é careta. Querem aproveitar a vida e ao mesmo tempo receiam contrair a AIDS. Muitas vezes a empolgação do momento, o calor da paixão, os faz esquecer das conseqüências e do ditado que diz: quem vê cara não vê aids. Alguns, sequer, possuem conhecimento das DST (doenças sexualmente transmissíveis) e como são transmitidas.
“Ao contrário do que muita gente pensa, as DST são doenças graves que podem causar disfunções sexuais, esterilidade, aborto, nascimento de bebês prematuros com problemas de saúde, deficiência física ou mental, alguns tipos de câncer e até a morte. Uma pessoa com DST também tem mais chance de pegar outras DST, inclusive a aids (http://www.aids.gov.br/final/prevencao/dst.htm).Abaixo listamos algumas doenças retiras do site: http://www.dst.com.br/Cancro Duro (Sífilis), Cancro Mole, Candidíase, Herpes Simples Genital, Gonorréia, Condiloma acuminado/HPV, Linfogranuloma Venéreo, Granuloma Inguinal, Pediculose do púbis, Hepatite B, AIDS, Infecção por clamídia, Infecção por trichomonas, Infecção por ureaplasma, Infecção por gardnerella.Por todos estes problemas os pais sabem que devem conversar com os filhos, mas não sabem como fazê-lo. De um lado estão os adolescentes que sentem vergonha, não querem que entrem na sua intimidade, preferem conversar com amigos trocando experiências obtendo muitas vezes informações distorcidas e errôneas sobre a relação sexual. Do outro lado estão os pais angustiados, com medo da aids, de uma gravidez indesejada e que querem de uma hora para outra ser amigo ou orientador.
O que os pais devem saber é que ninguém abre seu mundo de repente. Este é um processo de confiança e ajuda que deve ser iniciado na infância e acompanhado sempre com amor, compreensão, paciência, cautela e sem dúvida boas informações.
Se os pais sempre evitaram ter estas conversas desde a infância, poderá encontrar grande resistência para um diálogo quando chegar na adolescência, mas nunca devem desistir. É necessário aproveitar as oportunidades que surgem naturalmente para iniciar um diálogo, sem forçar nada.
Arantangy observa que “Vejo pais forçando uma intimidade que incomoda os filhos. É preciso que os pais falem de si, pois a intimidade é partilhar emoções numa via de mão dupla”. (1995, p. 94)
Entretanto é necessário que haja limites na conversa entre pais e filhos. O respeito deve sempre existir. Pai e mãe não são coleguinhas que trocam figurinhas, mas sim pessoas adultas que devem se mostrar como seres humanos que sentem, erram, acertam como qualquer outro. É isto que os pais devem demonstrar, não precisam necessariamente falar sobre tudo que já passaram, desta forma estarão evitando que sejam apontados como culpados caso os filhos cometam algum erro igual ao do passado dos pais. O adolescente pode pensar: se meu pai fez, eu também posso fazer.
Pais que tiveram uma educação rígida normalmente possuem dificuldade em lidar com este tipo de assunto. Muitos possuem uma sexualidade problemática, mal resolvida e não sabem como ajudar seus filhos. Como diz Marta Suplicy: “A grande maioria dos pais buscam uma receita, uma resposta fácil para baixar sua ansiedade diante da situação que eles estão vivendo" (1983, p. 34).
De um lado podemos encontrar aqueles pais que fingem nada estar acontecendo com receio de enfrentar a situação. De outro estão os superprotetores que querem saber tudo sobre o filho. Os pais devem ter em mente que não existe uma receita pronta. É importante buscar informação de como orientar os filhos, mas uma boa dose de intuição sempre ajuda.
Para falar de sexo com o filho é preciso, antes de tudo, criar um ambiente favorável, onde ele se sinta seguro, tendo liberdade sem correr o risco de ser reprimido.
A hora para estas conversas também deverá ser observada. Não se pode querer conversar num momento de um flagra da filha com o namorado, por exemplo, ambos estarão exaltados demais para trocar idéias. Também não precisa ser algo tão formal como fazer uma reunião com este destino. O ideal é aproveitar uma observação feita pelo filho diante de alguma cena na tv, ou se nada for comentado a mãe/pai/parente poderá perguntar: o que você acha disso?
Os pais devem estar atentos porque muitos adolescentes, com vergonha utilizam um colega como pivô da história falando na verdade de si mesmo, por exemplo: “mãe, fulana me disse que está afim de um garoto que ela acha que também está afim dela, mas ela não sabe como agir, o que ela deve fazer?”. Ao invés de responder prontamente, é interessante que a mãe devolva a pergunta: o que você faria? Ou: o que você acha que ela deveria fazer? Desta forma, você terá oportunidade de saber o que seu filho está sentindo e observar como pensa. Entretanto, se policie para não invadir onde não foi chamada. Não aproveite esta dúvida para perguntar coisas do tipo: “E você, está afim de alguém?” Espere até que ela sinta confiança em você para se abrir. Se isto não acontecer, reveja seus conceitos, atitudes e respostas.
Para o adolescente obter melhores informações sobre o sexo, a melhor opção seria levá-lo a um especialista. Um médico poderá orientá-lo sobre os métodos contraceptivos, riscos de doenças etc. É uma forma mais segura de aprender, pois nem sempre os pais saberão orientar bem nestas questões.
Se o adolescente não se sentir à vontade com a presença dos pais é importante que ele seja respeitado e que entre sozinho no consultório.
O PAPEL DO PROFESSOR
O professor exerce um importante papel na sexualidade da criança, que deve ser orientada de forma a preparar o indivíduo para a vida. Porém, para educar é preciso que o educador esteja preparado para tal tarefa.
Encontramos na maioria das escolas, grande deficiência na didática utilizada pelo professor. Muitas escolas que incorporaram no seu currículo a educação sexual, não se encontram preparados para assumir tal responsabilidade. Podemos constatar tal afirmativa no seguinte relato:
“Resultados de uma pesquisa que realizamos com professores sobre educação sexual, apontaram para a necessidade de sua formação exigindo, desta forma, o desenvolvimento de programas adequados à sua capacitação nesta área. Obviamente tais resultados eram esperados, uma vez que as Faculdade de Educação e os cursos de formação de professores de 1º e 2º graus pouco ou nenhum preparo propiciam em relação à sexualidade humana, com enfoques multidisciplinares” (Fagundes, 1995, p. 21). Antes de começarmos a falar da sala de aula, abordaremos uma situação diante da qual muitas escolas ainda não se prepararam para enfrentar e que, acontecendo e não havendo a orientação adequada, haverá uma repercussão bastante negativa na vida do aluno. Vejamos: como reage um funcionário da limpeza que pega duas crianças no banheiro, por exemplo, mexendo em seus órgãos genitais, ou um mexendo no outro, ou quando pega duas meninas se beijando, ou um casal se acariciando? Será que esta pessoa está preparada para lidar com esta situação? Que procedimento ela deveria tomar? Uma pessoa despreparada teria como reação imediata gritar, espantar-se, mencionar palavras que possam humilhar, ou mesmo espalhar entre outros funcionários ao invés de encaminhá-los ao setor de orientação para que o orientador possa conversar, explicar as diferenças entre meninos e meninas, falar da homossexualidade, enfim, o que ocorrer.
A escola deverá estar atenta a estas situações, que poderão ocorrer em qualquer idade, e preparar seus funcionários para enfrentá-las sem espanto, desde os auxiliares da limpeza, porteiros, recepcionistas, secretárias enfim, todo corpo de funcionários.
Lembro-me de uma amiga que me ligou desesperada porque a escola a chamou para contar que sua filha de cinco anos estava na casinha do parque da escola com um menino e uma menina da mesma idade, abaixando o short e mostrando seus órgãos genitais. Esta mãe disse que chorou muito e não sabia o que fazer. Disse-lhe então que isto era normal nesta idade, que era uma fase de descobertas das diferenças sexuais, que a curiosidade era natural. Sugeri que comprasse um livro infantil sobre sexo e que mostrasse, através das ilustrações, as diferenças entre meninos e meninas entre homens e mulheres, e sempre que a criança mostrar interesse, conversar sem fazer alarmes.
É difícil falar, em sala de aula, sobre homossexualidade, quando há um aluno homossexual e cujos colegas ainda não estão amadurecidos para aceitá-lo ocorrendo, desta forma, piadas e risos que machucam e levam à baixa auto-estima, podendo ter, como conseqüência, baixa no rendimento escolar. O orientador deverá incluir na sua fala temas como respeito e preconceito.
Bem como é difícil também falar sobre abuso sexual quando se sabe que alguém já foi vítima deste drama. Em sua grande maioria, a vítima não sabe reconhecer o abuso e conseqüentemente não saberá proteger-se. A vítima sente vergonha, insegurança, medo e culpa pela situação achando que ela provocou o abuso. A maioria das pesquisas mostra que este tipo de abuso parte de pessoas muito próximas como padrastos e até mesmo o pai ou irmão. Os danos causados não ficam apenas no âmbito físico. Ocorrem danos principalmente psicológicos prejudicando o desenvolvimento de sua personalidade. Em geral os sintomas são aparentes: relaciona-se mal e pouco com outras crianças, demonstra timidez, depressão e insegurança; apresenta, muitas vezes, nervosismo, comportamento compulsivo e distúrbios de sono.
Entretanto o orientador não poderá deixar-se intimidar. É necessário informar, discutir, ouvir e orientar falando de forma clara para que possam compreender que é algo errado, que a pessoa não deve se sentir culpada pelo que está acontecendo e a importância da denúncia, sem, no entanto mencionar o nome da vítima, é claro. Desta forma espera-se que o aluno que estiver passando por esta situação, adquira confiança no orientador a ponto de se abrir em particular e pedir ajuda.
O objetivo da educação sexual na escola consiste em colocar professores com um preparo adequado e desempenhar de forma significativa seu papel, ajudando os alunos a superarem suas dúvidas, ansiedades, angústias, pois “A criança chega na escola com todo tipo de falta de informação e geralmente com uma atitude negativa em relação ao sexo. As dúvidas, as crendices e posições negativas serão transmitidas aos colegas”. (SUPLICY, 1983, p. 49)
Educação sexual não significa apenas passar informações sobre sexo. Significa também o contato pessoa / pessoa, transmissão de valores, atitudes, comportamentos. É importante observar se estes educadores estão preparados psicologicamente para falar sobre sexo. A maioria não fez nenhum tipo de curso. O que sabem é baseado em curiosidades de revistas e troca de informações com colegas, ou na leitura de livros que só traduz o biológico sem levar em conta respeito, sentimentos e emoções como já foi dito.
Muitos destes orientadores não possuem a própria sexualidade bem resolvida, tendo problemas com seu parceiro ou consigo mesmo em relação ao sexo. Em seu discurso, certamente passarão um tom de frustração e inquietação.
De acordo com Teles “As pessoas encarregadas de orientação sexual na escola devem ter autenticidade, empatia e respeito. Se o lar está falhando neste campo, cabe à escola preencher lacunas de informações, erradicar preconceitos e possibilitar as discussões das emoções e valores” (1992, p. 51).
Os professores também devem evitar emitir seus próprios juízos de valores e opiniões como verdade absoluta. Sabemos que é impossível ficar totalmente isentos de opinar e nem devemos, mas é importante que as questões sejam lançadas, refletidas, discutidas, sem que apenas uma resposta fique como a correta.
Esclarecer os limites também faz parte do papel do orientador. Este deve mencionar algumas questões importantes como o que se pode fazer em locais públicos e privados para que a intimidade seja preservada. Isso cabe principalmente às crianças que ainda não possuem esta noção bem definida.
Falar sobre a aprovação das brincadeiras sexuais, do consentimento do outro, é muito importante. Explicar que tais brincadeiras não devem ser feitas entre adultos e crianças ou entre crianças e adolescentes.
Deve existir também uma efetiva parceria, ou seja, os pais não devem delegar e restringir este assunto apenas no âmbito escolar. Para que isto aconteça é necessário que a escola dê um retorno aos pais do que está sendo visto, as reações dos alunos, temas que estão em pauta, convite aos pais para assistirem debates juntamente com os alunos e estar aberta aos pais para orientá-los no caso de não saberem como lidar com os questionamentos dos filhos.
Alunos com desempenhos ruins podem estar passando por problemas ou crises, o que é muito comum na adolescência. Com um olhar mais aguçado, o professor poderá perceber a inquietação do aluno. Situações como encontrar pornografias nas portas dos banheiros, nas carteiras, agressividade utilizando-se de palavrões relativos ao sexo já merece uma atenção especial. São formas que o adolescente utiliza para expressar seus medos, angústias e distorções. Cabe ao professor, esclarecido e consciente de seus deveres, ajudá-los na superação desta fase tão difícil para muitos tendo como objetivo o esclarecimento e amadurecimento do indivíduo.
A escola deve informar aos pais sobre o projeto de orientação sexual para que os pais concordem e estejam cientes, evitando serem pegos de surpresa com frases ditas pelos filhos como: “hoje a professora mostrou um pênis e uma vagina”.
De acordo com o PCN´s - Orientação Sexual, escolas que tiveram bons resultados com a orientação sexual, relatam resultados como aumento do rendimento escolar, devido ao alívio de tensão e preocupação com questões da sexualidade e aumento da solidariedade e do respeito entre os alunos. Para crianças menores relatam que informações corretas ajudam a diminuir a angústia e agitação em sala de aula (p. 122, 1997).
CONCLUSÃO
Desde 1989 em seu livro Etiologia Sexual das Neuroses, Freud já mencionava a necessidade de mudanças dizendo que: “Seria necessário mudar muitas coisas... Mas é preciso, sobretudo dar lugar à discussão dos problemas da vida sexual junto à opinião pública. Terá que ser possível falar dessas coisas sem sermos considerados um fator de problemas ou alguém que explora os instintos mais baixos. E aqui também há muito o que fazer para que no decorrer dos próximos cem anos nossa civilização aprenda a se compor com as exigências de nossa sexualidade”. (BETTS, p. 48, 1995)
A educação para a sexualidade deve considerar que para o indivíduo viver com plenitude no mundo que o cerca, é preciso estar sensibilizado para respeitar a si mesmo e aos outros, saber relacionar-se, ter responsabilidade, crer na vida e procurar vivê-la com prazer, conhecendo seus próprios direitos inclusive o de ser feliz.
Toda educação sexual precisa fundamentar-se nos alicerces da vida do ser humano, marcada pelos registros inconscientes dos primeiros contatos e experiências. Os pais e educadores devem estar conscientes de que a educação sexual correta desde a infância promove o desenvolvimento de um ser humano saudável mentalmente e fisicamente. O indivíduo aprende a refletir sobre seus valores, distinguindo o conceito de certo e errado diante do mundo em que vive. Aprenderá a respeitar a individualidade e a opção sexual de cada um, pois o importante é viver e estar bem resolvido consigo mesmo.
Fagundes nos diz que “É preciso criar oportunidades para que as pessoas reflitam sobre suas idéias, sentimentos e conflitos na área da sexualidade e envolvam a totalidade do seu ser na re-interpretação e reconstrução da realidade”.
Este indivíduo terá maiores chances de crescer como um ser dotado de maturidade suficiente para saber conduzir cada momento novo que vive, cada problema de forma consciente e segura.
Referências Bibliográficas
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Publicado em 14/01/2005