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SIMAIA SAMPAIO
Psicóloga, Neuropsicóloga
Psicopedagoga
A dislexia é um transtorno específico de leitura com repercussão na escrita. É normalmente identificada a partir da alfabetização, período em que a criança inicia seu processo de aprendizagem de leitura e escrita. Seu problema torna-se bastante evidente quando, após ter cursado a alfabetização, sua leitura ainda permanece silabada, com trocas e adições ou omissões de letras ou sílabas dentro da palavra.
A criança que está cursando a alfabetização, pode não deixar tão evidente suas dificuldades de leitura, afinal ainda é normal realizar leitura silabada e trocas neste período, no entanto, a criança disléxica pode apresentar algumas dificuldades associadas que podem chamar atenção, tais como:
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Atraso no desenvolvimento psicomotor: pode andar um pouco mais tardiamente.
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Dificuldades na coordenação motora fina: pode ter dificuldades para amarrar cadarço, utilizar talheres para comer sozinho e ser desajeitado na sua coordenação.
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Atraso na aquisição da linguagem: pode demorar a falar ou falar com trocas na fala.
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Dificuldade na aprendizagem das letras: enquanto todas as crianças da sua turma de alfabetização já aprenderam as letras, a criança disléxica pode apresentar atraso nesta aprendizagem, sendo comum pais e especialistas dizerem: "Eu ensino, ele parece que aprendeu, mas esquece muito rapidamente".
Embora não se possa fazer diagnóstico nesta fase de alfabetização, é importante que pais e professores fiquem atentos, quando a criança chega ao final da alfabetização ainda apresentando muitas dificuldades na leitura e na escrita, afinal tiveram contato com esta aprendizagem durante um ano inteiro! Podemos entender que esta é uma criança de risco para o transtorno de leitura, sendo indicado que inicie imediatamente uma intervenção psicopedagógica e fonoaudiológica, e não esperar que a criança aprenda sozinha. O velho discurso de "cada um tem seu tempo de aprendizagem" é um pensamento retrógrado e só faz com que a criança atrase ainda mais o seu desenvolvimento na leitura, afetando inclusive sua autoestima, uma vez que ela se percebe atrasada em relação aos seus pares e se entristece.
As crianças com dislexia apresentam inteligência normal ou muitas vezes acima da média. É critério diagnóstico para dislexia que seu QI deve estar acima de 70, descartando a possibilidade de que uma deficiência intelectual seja a causa das dificuldades. Tendo uma inteligência normal, a criança com dislexia não manifesta suas dificuldades até que se depare com situações de leitura. Sua dificuldade consiste em não conseguir identificar símbolos gráficos rapidamente (letras) e realizar a conversão grafema/fonema, ou seja, associar rapidamente o fonema à sua grafia, tendo como conseqüência disso uma leitura lenta e com trocas e inversões.
A dislexia normalmente é hereditária. Estudos mostram que dislexos possuem pelo menos um familiar próximo com dificuldade na aprendizagem da leitura e escrita.
O transtorno envolve percepção visual, memória e análise visual. A área do cérebro responsável por estas funções envolve a região do lobo occipital e parietal.
Pessoas com dislexia podem apresentar as seguintes características, lembrando que cada pessoa pode manifestar alguns sintomas e não todos, e pode haver quadros mais leves da dislexia e outros mais moderados a severos:
- Dificuldades iniciais para aprender as letras e seu sons.
- Confusão de letras, sílabas ou palavras que se parecem graficamente: a-o, e-c, f-t, m-n, v-u.
- Inversão de letras com grafia similar: b/p, d/p, d/q, b/q, b/d, n/u, a/e.
- Inversões de sílabas: em/me, sol/los, las/sal, par/pra.
- Adições ou omissões de sons: ao invés de ler casa lê casaco, prato lê pato.
- Ao ler pula linhas ou volta para a anterior.
- Soletração defeituosa: lê palavra por palavra, sílaba por sílaba, ou reconhece letras isoladamente sem conseguir ler.
- Leitura é lenta para a idade escolar e as oportunidades que já vivenciou.
- Ao ler, movem os lábios murmurando.
- Freqüentemente não conseguem orientar-se no espaço podendo apresentar dificuldades em distinguir direita de esquerda. Isso pode trazer dificuldades para se orientarem com mapas, globos e no próprio ambiente.
- Possui dificuldades em lembrar seqüências: letras do alfabeto, dias da semana, meses do ano.
- Dificuldade em aprender a ler as horas.
- Pode ter dificuldades para lembrar-se de fatos passados como horários, datas, diário escolar.
- Alguns possuem dificuldades de lembrar-se do nome de objetos, de evocar alguma palavra rapidamente.
- Muitos conseguem copiar, mas na escrita espontânea como em um ditado ou redação pode evidenciar severas complicações ortográficas e gramaticais.
O transtorno acomete mais meninos do que meninas.
A pessoa com dislexia geralmente demonstra insegurança e baixa auto-estima, sentindo-se triste e culpado por não atender as expectativas de seus pais e professores. Muitos se recusam a realizar atividades escolares com receio de mostrar seus erros escritos. Com isto desenvolvem um vínculo negativo com a aprendizagem, podendo apresentar atitudes agressivas, hostis e opositoras com professores e colegas.
O diagnóstico pode ser feito a partir do 3º ano, período em que a criança já teve pelo menos dois anos em contato frequente com a leitura e a escrita (1º ano que é a alfabetização e o 2º ano que é antiga 1ª série).
O mais indicado é que a criança passe por uma avaliação multididisciplinar: neuropsicológica, psicopedagógica ou neuropsicopedagógica e neurológica.
Durante uma avaliação neuropsicológica, alguns testes serão aplicados:
- Teste de QI com o objetivo de descartar imaturidade cognitiva (QI abaixo de 70 se constitui em Transtorno da deficiência intelectual e portanto a dificuldade de leitura não pode ser atribuída a uma dislexia). Este é um critério estabelecido para diagnóstico no DSM-5-TR;
- Aplicar questionários e testes para descartar problemas emocionais graves como uma depressão que pode interferir na aprendizagem da leitura. Todavia é preciso ter cuidado porque é possível que a própria dificuldade de leitura desencadeie uma depressão e não o contrário.
- Através de entrevistas com pais e professores, o avaliador poderá identificar se a criança foi submetida a métodos defeituosos de aprendizagem; se a criança teve muitas faltas na escola por um motivo de saúde, por exemplo, fazendo com que não frequentasse as aulas de alfabetização com regularidade.
- Numa avaliação neuropsicológica, é possível que o avaliador identifique que haja alguma comorbidade, como por exemplo um TDAH (Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade), ou TEA (Transtorno do Espectro Autista), Disfunções Executivas, o que pode atrasar ainda mais sua aprendizagem.
- Anamnese com a família.
Durante uma avaliação psicopedagógica ou neuropsicopedagógica, alguns testes serão aplicados:
- Testes padronizados de leitura de palavras e pseudopalavras;
- Testes padronizados de compreensão leitora;
- Testes padronizados de escrita de palavras (ditado);
- Escrita de um texto para observar erros ortográficos e construções de frases e parágrafo.
- Caso a família não possa pagar uma avaliação fonoaudiológica, o psicopedagogo pode se utilizar de instrumentos de avaliação da consciência fonológica para fazer uma sondagem e depois encaminhar para uma avaliação mais completa com profissional da fonoaudiologia.
- Caso a criança tenha chegado ao psicopedagogo sem antes ter realizado uma avaliação neuropsicológica, o psicopedagogo pode aplicar as provas operatórias e sondar como está o raciocínio lógico do avaliando (Crianças com defasagem no raciocínio podem aprender a ler, mas ter dificuldades na compreensão leitora, em função de questões de lógica). Poderá também aplicar testes multidisciplinares e não restritos para avaliar as funções executivas (memória de trabalho, planejamento, controle inibitório) e caso encontre dificuldades, realizar posteriormente o encaminhamento para avaliação aprofundada com psicólogo especializado em neuropsicologia.
- Anamnese com a família.
Durante uma avaliação fonoaudiológica, alguns testes serão aplicados:
- Avaliação das habilidades metafonológicas;
- Avaliação da linguagem para investigar se há um transtorno de linguagem associado.
- Anamnese com a família.
Durante uma avaliação neurológica
- O médico irá realizar a consulta padrão, ouvir a queixa, pode solicitar alguns exames para descartar outras possibilidades que justifiquem as dificuldades, tais como exames de sangue ou de imagens, e fazer o encaminhamento para avaliação com neuropsicólogo e psicopedagogo.
TRATAMENTO E ORIENTAÇÕES:
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O tratamento deve ser realizado por um especialista ou alguém que tenha noções de ajuda ao dislexo. Deve ser individual e freqüente. Durante o tratamento deve-se usar material estimulante e interessante.
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Ao usar jogos e brinquedos empregar preferencialmente os que contenham letras e palavras.
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Reforçar a aprendizagem visual com o uso de letras em alto relevo, com diferentes texturas e cores. É interessante que ele percorra o contorno das letras com os dedos para que aprenda a diferenciar a forma da letra.
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Deve-se iniciar por leituras muito simples com livros atrativos, aumentando gradativamente conforme seu ritmo.
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Utilizar o método fônico para alfabetização e não o método global. A pessoa com dislexia tem dificuldades em memorizar o todo da imagem, o que torna o método global ineficaz para estas pessoas. Um problema na região occipto-temporal explica a dificuldade da pessoa com dislexia ser lenta na leitura global da palavra e portanto o método fônico se torna mais eficiente.
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O tratamento psicológico não é recomendado para tratar a dislexia em si, mas pode ser recomendado se a pessoa estiver com problemas de aceitação de suas dificuldades.
COMO A ESCOLA PODE AJUDAR O ALUNO COM DISLEXIA:
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Posicione o aluno sempre próximo ao professor;
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O aluno deverá realizar as provas em uma sala silenciosa, com ajuda de um ledor. Isto não é excluir! É atender o aluno em suas necessidades específicas. Lembre-se que a dislexia não é algo inventado pelo aluno, ele não consegue realizar a leitura com fluência e consequentemente tem problemas com a compreensão, portanto seja útil na vida deste aluno e ajude! A exigência acentuada pode levar o aluno a desenvolver transtornos de oposição, depressão ou ansiedade.
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Não exija que o aluno faça avaliação de outra língua. Deve-se dar mais importância à superação ou amenização de sua dificuldade com a língua materna, do que na aprendizagem de outra língua. Substitua a prova por trabalhos.
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Substituir o ensino através do método global, por um sistema mais fonético, que ensine a conversão grafema/fonema e que o aluno possa aplicar esta consciência fonológica em diversas palavras.
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Não estimule a competição com colegas nem exija que ele responda no mesmo tempo que os demais.
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Não force o aluno a ler em voz alta se ele não quiser.
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Se o aluno tiver disgrafia, oriente o aluno a escrever em linhas alternadas no caderno, para que tanto ele quanto o professor possa entender o que escreveu.
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Quando a criança não estiver disposta a fazer a lição em um dia ou outro não a force. Procure outras alternativas mais atrativas para que ele se sinta estimulado.
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Nunca critique negativamente seus erros. Procure mostrar de forma discreta onde errou, porque errou e como evitá-los. Mas atenção: não exagere nas correções, isso pode desmotivá-lo. Procure mostrar os erros mais relevantes.
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Peça que os pais releiam o diário de classe sem criticá-lo por não conseguir fazê-lo, pois a criança pode esquecer o que foi pedido e/ou não conseguir ler as instruções.
Referências:
CONDEMARÍN, Mabel, BLOMQUIST, Marlys. (1989). Dislexia; manual de leitura corretiva. 3ª ed. Tradução de Ana Maria Netto Machado. Porto Alegre: Artes Médicas.
ELLIS, Andrew W. (1995). Leitura, escrita e dislexia: uma análise cognitiva. 2 ed. Tradução de Dayse Batista. Porto Alegre: Artes Médicas.
JOSÉ, Elisabete da Assunção José & COELHO, Maria Teresa. Problemas de Aprendizagem. 12ª edição, São Paulo: Ática.
Como referenciar este texto:
SAMPAIO, Simaia. Dislexia. Psicopedagogiabrasil, 2024. Disponível em: <www.psicopedagogiabrasil.com.br/dislexia>. Acesso em: dia, mês e ano.
Publicado em 09 de outubro de 2010. Revisado em 28 de janeiro de 2024.
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Autora: Simaia Sampaio
Publicado em: 09 de outubro de 2010 (Ver forma de referenciar ao final do texto)
Imagem do Curso de Raciocínio Clínico na Avaliação Psicopedagógica para suspeita de Transtornos da Leitura e Escrita, baseado em evidências da neurociência, com Simaia Sampaio.
Problema no cérebro do disléxico nas áreas posteriores. Prejuízos na leitura global da palavras (área pintada de rosa).